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por Larissa

Flores Raras, de Bruno Barreto, estreou nesta sexta-feira, 16, em 150 cinemas do Brasil. O filme, exibido anteriormente na abertura do festival de Gramado, ficou em 1º lugar de público no festival de cinema de São Francisco e em 2º lugar em Berlim. Não é à toa que a obra era ansiosamente aguardada pelas lésbicas do país.


Trata-se da história de amor, entre duas mulheres notáveis: Lota de Macedo Soares, a idealizadora e responsável pela construção do Aterro do Flamengo; e Elisabeth Bishop, renomada poetisa estadunidense, ganhadora, dentre outros, do Prêmio Pulitzer de 1956, com a obra Norte e Sul, escrita no período em que estava no Brasil.

Veja o trailer do filme: 


Antes da divulgação do trailer, havia receios a respeito da representação das personagens que iríamos encontrar. Não é raro, no cinema, que figuras célebres reconhecidamente homossexuais tenham essa parte de sua identidade disfarçada, ou apresentada apenas como um mero detalhe, como se viver a homossexualidade abertamente em uma cultura heteronormativa fosse algo banal na vida das pessoas. Os exemplos são muitos, não cabe aqui uma lista.

Em Flores raras, as cenas são claras. As duas se amam, se beijam, trocam carícias ternas e picantes. É mesmo possível reconhecer uma representação de afetividade convincente entre duas lésbicas. Glória Pires encena uma Lota decidida e autoritária, poço de segurança que se desfaz. Em uma certa crítica do filme, a atriz foi acusada, por essa atuação corajosa, de fazer uma caricatura forçada de masculinidade. Não há artificialidade nisso, não é uma caricatura. Nem todas as mulheres (ainda bem) seguem os padrões rígidos de feminilidade impostos pela cultura sexista heteronormativa. Isso não é caricatural, é a diversidade das formas de se ser pessoa humana.

Apesar de Bruno Barreto negar que o filme seja sobre homossexualidade, mas sim sobre perdas, o tema está lá com a própria vivência homossexual dessas mulheres históricas. É louvável que haja esse e outros temas. Já Glória Pires, em entrevista no festival de Gramado, comenta a importância da questão no filme em nosso momento político de avanços e reações apavoradas dos grupos conservadores em relação aos direitos homossexuais. Vale lembrar que o projeto do filme, iniciado há 17 anos com a compra dos direitos autorais do livro por Lucy Barreto, lidou com dificuldades em conseguir patrocínio pelo receio que muitas instituições têm de vincular suas marcas à homossexualidade.

E voltamos à pergunta título: Por que gostamos de ver lésbicas no cinema?
Gostamos de ver lésbicas no cinema, na televisão, nos livros porque gostamos de nos sentir representadas. Gostamos de reconhecer nossos conflitos, alegrias, anseios. As histórias contadas são formas de representação da realidade. Elas podem confirmar nossas crenças, reforçar ou questionar padrões, trazer reflexões sob outras perspectivas. O fato de só haver representações de amor heterossexuais acessíveis ao público em geral e principalmente aos adolescentes é uma violência através do silenciamento. 

Lembro que na minha adolescência não vi NADA que contemplasse outras formas de amor. As “lésbicas” que vi na televisão foram em produções pornográficas feitas para homens heterossexuais. Não é de se surpreender que esse tipo de material fosse mais acessível - depois da meia-noite na TV a cabo - que uma representação de afetividade autêntica entre duas mulheres. Ou seja, tudo bem que existissem lésbicas, mas para satisfação de desejos masculinos. Mas enfim, isso era final da década de 90. As coisas vão mudando, ainda que gays e lésbicas apareçam apenas de vez em quando, ainda como algo excepcional no grande circuito das narrativas cinematográficas ou literárias. Essa excepcionalidade não garante a quebra dos padrões, mas essa ínfima existência é um respiro em meio ao mar de produções que confirmam estereótipos heterossexuais de como ser mulher e de como ser homem.  O sucesso de Flores raras é sinal de novos tempos.

Veja:

por Maria C.

Há uma ideologia perversa rondando a vida das mulheres. Como um vento gelado, um vírus incontrolável, essa coisa entra por todas as frestas, nos alcança por todos os lados, numa espécie de Estado totalitário midiático nazista sei-lá-o-quê. Não dá pra escapar: é o mito da beleza, a ditadura da magreza, da juventude, da perfeição. Mulher que é mulher é linda, jovem, magra, clara, bem cuidada, perfeita.

Não sou autoridade no assunto, nem é o tema, mas durante o nazismo, buscou-se apoio científico, nas ciências naturais da época, a fim de justificar-se a superioridade da raça ariana; da filosofia, utilizando-se inadequadamente os ideais de Nietzsche: seu conceito de super-humano em contraposição ao niilismo (em “Assim falou Zaratruschta”), havendo suposta ligação entre o nazismo e o Übermensch; e ainda, aliada ao uso pesado da mídia, foi utilizada a estética em favor do ideal totalitário. Hitler afirmou que “o maior princípio de beleza é a saúde”. Isso soa tão familiar...

Decaídas as questões políticas, militares e expansionistas, mas persistente o cinismo pseudocientífico e a necessidade de dominação e de criação de uma espécie superior – uma espécie superior de mulheres em relação às outras, as supermulheres, ouso afirmar que estamos vivendo uma espécie de nazismo criado especialmente para nós, mulheres.

Qualquer comercial de TVdestinado diretamente ao público feminino confirma a minha tese: “Cuidar das axilas é fácil!” ou então “O que você faz para acabar com as pontas duplas?” Vejam só, as mulheres devem inserir cuidados diários com suas axilas, que não bastam estar depiladas; devem ser claras, lisas, esfoliadas e macias! E as pontas duplas, então? Seus cabelos, pintados, alisados, chapados, hidratados, selados e sei-lá-o-quê devem receber diariamente produtos para evitar as pontas duplas, pois onde já se viu uma mulher ter pontas que não possam imitar uma franja? Nos filmes, nas novelas, nos telejornais e também nos comerciais de TV, todas as mulheres são magras, jovens, tem lindas peles e estão maquiadas, ao passo que os homens são normais: têm gordos, magros, altos, baixos, jovens, velhos, carecas, cabeludos, com dentes brancos ou amarelos.

Existe então uma nova raça, de supermulheres, as mulheres perfeitas, e digo esteticamente perfeitas, e somente estas têm dignidade para serem representadas na mídia? Ou melhor, apenas estas representam as mulheres, de modo que as demais não merecem sequer representação? Somos o terceiro estado pré-revolucionário, acaso? Um alienígena que necessitasse coletar dados sobre a população feminina e partisse da representação midiática sofreria um choque. Não acreditaria na disparidade daquilo que vê na TV e nas ruas. Onde estão as mulheres perfeitas, se perguntaria ele? Vivem no Olimpo? 

A questão é: porque querem nos fazer acreditar que precisamos dos “valores” que nos impõem, que precisamos internalizar estes valores, que necessitamos tanto da transvaloração do que é próprio do ser humano para apropriar “valores” femininos, tão externos e estéticos, a fim de definir o que é uma mulher, ao menos uma mulher de verdade, uma mulher bem sucedida, uma mulher perfeita. Por que de que adianta ter uma bela carreira, ser respeitável em seu meio, mas esteticamente ser considerada uma bruxa velha? É isso o que conta para as mulheres? Segundo aqueles novos valores propriamente femininos impostos pelo ideário anti-feminino (o nazismo feminino de que falo, em sátira), o poder, também inerente ao übermensch, no caso da mulher, é inútil, se ela é feia, ou gorda, ou tem rugas, manchas na pele, eventualmente um cabelo seco ou uma simples unha quebrada. Ela é menos mulher. Em seu tamanho poder lhe debocham pelas costas, onde já se viu uma mulher dessas não fazer as unhas? E por que, querida leitora, eu lhe pergunto, porque nós concordamos com esses editoriais nazi-fascitas em revistas sorridentes, que dizem que devemos pesar 50kg aos 45 anos e, deus nos livre, ter celulite? Por que corremos às lojas de cosméticos atrás dos hidratantes de axilas, dos esfoliantes de cotovelos; das clínicas de estética, dizendo amém, e socorro, sou um lixo humano e não mereço viver pois tenho cílios curtos? 

Porque há uma diabólica conspiração, tão evidente e escancarada, e há tanta gente lucrando com isso, que não nos questionamos mais: mulheres feias não têm representatividade, direitos, nem dignidade: não é mais literário (desgraçado Vinícius), é constitucional e científico, afinal, magreza anoréxica de passarela é saudável, e qualquer 200g a mais é obesidade mórbida. Tudo saúde, e morte aos gordos, porque barriga não é mais um órgão, mas um pecado mortal, uma coisa horrorosa, banida da TV, e isso é sério.

Minha ironia se deve à raiva, ao desprezo mesmo à tamanha tentativa de dominação da força feminina.

A tentativa de confinamento das mulheres no espelho, centradas em seu umbigo é repulsiva. Trata-se de uma estética de destruição, querem que nos rasguemos, nossas próprias algozes, de modo que assim, deixemos o caminho livre para que qualquer um nos explore, e explore qualquer necessidade patética que resolvam nos impingir, tais como hidratar as axilas ou viver de dieta intravenosa, um dogma! A revolta é grande. 

A solução? Diante de uma cultura de dominação forte/fraco, lógico/sentimental, tão arraigada e imposta tão covardemente que acreditamos que se funda na ciência, e é inata (!), é preciso de um movimento contrário de idêntica força, que parta da rejeição desta cultura. Um despertar já seria um começo. Conhecer a verdade e descobrir que não precisamos de nada do que nos dizem já é um passo a caminho da liberdade. Abra sua mente. Diga não. 

Quem sabe?


por Mazu



Eu não sou um homem

(Harold Norse, EUA, 1916-2009)
Eu não sou um homem, não consigo ganhar a vida, comprar coisas novas pra minha família.


Eu tenho espinhas e um pau pequeno.
Eu não sou um homem. Eu não gosto de futebol, boxe e carros.


Eu gosto de expressar meus sentimentos. Eu até gosto de colocar meu braço sobre os ombros de meus amigos.

Eu não sou um homem. Eu não vou jogar o papel que me foi atribuído – o papel criado pela Madison Avenue, pela Revista Playboy, Hollywood e por Oliver Cromwell.


Televisão não dita meu comportamento.
Eu não sou um homem. Uma vez quando atirei num esquilo eu jurei que nunca mais mataria de novo. Desisti da carne. Ver sangue me deixa doente.


Eu gosto de flores.
Eu não sou um homem. Fui preso por resistir ao recrutamento. Eu não brigo quando homens de verdade me batem e me chamam de bicha. Eu não gosto de violência.

Eu não sou um homem. Eu nunca estuprei uma mulher. Eu não odeio os negros.


Eu não fico emotivo quando agitam a bandeira. Eu não acho que deveria amar a América ou deixá-la. Eu acho que eu deveria rir dela.
Eu não sou um homem. Eu nunca tive gonorréia.
Eu não sou um homem. Playboy não é minha revista favorita.
Eu não sou um homem. Eu choro quando estou triste.
Eu não sou um homem. Eu não me sinto superior às mulheres.
Eu não sou um homem. Eu não uso suspensórios.
Eu não sou um homem. Eu escrevo poesia.
Eu não sou um homem. Eu medito sobre paz e amor.
Eu não sou um homem. Eu não quero te destruir.


São Francisco, 1972
(tradução de Jeff Vasques)
 
Lendo esta belíssima tradução feita pelo nosso compa Jeff, me peguei pensando em todo estereótipo que envolve o masculino.

A gente fala muito no blog do que é ser mulher em uma sociedade machista, mas o estereótipo do homem com H maiúsculo também não deve ser bolinho não. 

Obviamente, as mulheres sofrem mais discriminação e violência, mas, na real, ninguém é livre e ninguém pode ser. O machismo oprime a todos nós. 

Não ia ser massa, a gente em uma sociedade que respeitasse o que se tem de "masculino" e o que se tem de "feminino" em cada um? Ninguém é unidimensional, e isso que é o bonito da humanidade, né? Imagina o dia que a gente aceitar? Que lindeza que vai ser...

por Mazu



Hoje, resolvi falar de um movimento que merece ser falado, lembrado, amado, idolatrado, oh boy! Quero pedir as meninas do Guerrilla Girls em casamento, e elas provavelmente me diriam que não, que casamento é bobagem de uma sociedade machista e tals. Enfim, guerrilla girls, suas lindas!! 

1 - Quem são as Guerrilla Girls?

Nas palavras das gatas, ou melhor, gorilas:

"Somos um grupo de artistas mulheres que usa fatos, humor e visual chocante para expor sexismo, racismo e corrupção - no mundo da arte, na política e na cultura pop. Nós revelamos as entrelinhas, o subtexto, o que se faz vista grossa, o injusto" (...) "Tentamos retorcer um assunto e apresentá-lo de uma maneira que não foi feita antes, com a esperança de mudar a cabeça de algumas pessoas" (Käthe Kollwitz, uma das guerrilheiras fundadoras, em entrevista ao Estado de São Paulo).
 
Elas usam apelidos inspirados em grandes nomes femininos da arte, nas manifestações, nunca mostram o rosto, usam máscaras de gorilas (sério, como não amar?).

2 - Quando surgiram?

Elas começaram em 1985, em resposta a uma exposição do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque, a tal exposição, chamada de "Uma pesquisa internacional sobre pintura e esculturas contemporâneas", contava com 165 artistas, dos quais treze eram mulheres. Elas começaram com pôsteres nas redondezas do museu e foram crescendo. Passaram, então, a abordar não só temas relacionados à discriminação de gênero, mas também questões políticas e racismo.

3 - Por que máscaras de gorilas?

A lenda diz que uma das fundadoras era ruim de ortografia (história da minha vida) e escreveu gorila em vez de guerrilla. Outro motivo é que elas pretendem permanecer anônimas porque não querem o foco nas suas personalidades e sim nos fatos que elas expõem sobre machismo, racismo e discriminação.

4 -  O que elas fazem?

Como disse, elas começaram com pôsteres mostrando como a participação das mulheres nos museus era pequena. Conforme o movimento foi crescendo, os manifestos começaram a aparecer em outdoors. Grandes, gigantes manifestos com estatísticas, nomes e fontes. Muita gente ficou desconfortável, sabe? Essas feministas deselegantes, sério, como não amar?
Hoje, o movimento está maior com três divisões e com bastante reconhecimento. Elas fazem tours com workshops e apresentações teatrais.

Vale ler sobre, falar sobre e macacar por aí. Uma boa fonte é a Bravo! deste mês, na matéria da Nina Rahe, outra linda, sobre artistas mulheres.


Alguns exemplos do trabalho das Guerrilla Girls:

As vantagens de ser uma artista mulher:
1- trabalhar sem a pressão do sucesso;
2- Não ter que participar de apresentações com homens;
3- Ter uma fuga do mundo da arte em seus trabalhos gratuitos de free lancer
4- Saber que sua carreira pode decolar quando você tiver 80
5- Ter a certeza de que independente do tipo de arte que você produz, sua obra será classificada como feminina;
6- Não ficar presa em um cargo de professor titular;
7- Ver suas ideias no trabalho dos outros;
8 - ter a oportunidade de escolher entre a carreira e a maternidade;
9 - Não ter que engasgar com aqueles charutos enormes ou pintar vestida com ternos italianos;
10 - Ter mais tempo para trabalhar quando seu parceiro te larga por alguém mais novo;
11- Ser incluída em versões revisadas da história da arte;
12- Não ter que passar pela vergonha alheia de ser chamada de gênio;
13 - Ter suas fotos usando roupa de gorila publicada nas revistas de arte.

Pop-quiz das Guerrilla Girls:
Q. Se novembro* é o mês da consciência negra, e março o mês das mulheres, o que acontece o resto do ano?
R. (invertida) discriminação.

O Oscar anatômicamente representado:
Ele é branco e homem como os caras que ganharam.
Melhor diretor é um prêmio que nunca foi concedido a mulheres.
92,8% dos prêmios de roteiro foram concedidos a homens.
Apenas 5.5% dos prêmios de atuação foram concedidos a pessoas negras.

As mulheres precisam estar nuas para entrar no Museu de Arte Moderna?
Menos de 5% dos artistas são mulheres, mas 85% dos nus são femininos.

É isso, minha gente, chega de corpos brancos e sarados e carinha de pato nas fotografias. Não sei vocês, mas eu vou ali por uma máscara de gorila e sensualizar nas internets. ;)


por Barbara Falleiros

Olhando para as fotos, me bateu um desânimo tão grande que eu tive vontade de chorar. Então é isso mesmo, nós não valemos nada. Pensei nas vezes em que já senti sobre a minha pele mãos indesejadas. E me veio novamente aquela repulsa, reação infelizmente familiar a tantas mulheres. A todas as mulheres - ouso dizer - em pelo menos algum momento de suas vidas. Numa dessas vezes, quando eu tinha dez anos, um garoto da escola se divertia em passar a mão na bunda das meninas. Lembro-me bem da sua risada. Eu e as outras garotas não achávamos a menor graça, mas ele continuava. Como nos ensina desde cedo a cultura do estupro, agressão é brincadeira, assédio é humor.

O Pânico é um programa de "humor" fraco e primário que, como de costume na tv brasileira, funciona à base de brincadeiras de mau gosto e de humilhações, reforçando o preconceito e o sexismo desde a concepção de seus "personagens", do homossexual com hemorroidas à mulher planta meramente decorativa. No programa, o grau de importância das participantes mulheres se mede pela quantidade de roupa que vestem: aquela que aparece um pouco mais coberta tem um papel de destaque, embora permaneça sendo a loira burra japonesa gostosa. Nicole Bahls, antiga figurante de biquíni, estava feliz em voltar ao programa com uma promoção: "Não vou ficar mais usando biquíni. (...) Vou ficar sentada junto com os outros humoristas. Estou me sentindo ótima, emocionada com a volta."

Gerald Thomas, embora se veja como grande expoente artístico com carreira internacional - há prova de maior provincianismo do que a idolatria do exterior e o desprezo puro e simples por seu paisinho de quarto mundo, do qual ele mesmo reproduz o pior da cultura sexista? - não passa de um babaca que gosta de chocar e de mostrar o próprio pênis. Freud explica. Vergonhoso nivelamento por baixo esta sua vingança grosseira contra o Pânico, tentando levantar o vestido de Nicole e abrir o zíper da calça do colega repórter.

A grande repercussão do episódio mostra que, pouco a pouco, começa-se a questionar os limites de supostas "brincadeiras" do tipo. Ótimos textos foram publicados sobre o que aconteceu no lançamento do livro do dramaturgo, como o de Nádia Lapa: A cultura do estupro gritando e ninguém ouve. Eu chego tarde para acrescentar algo novo ao debate, mas gostaria apenas de chamar a atenção para o teor das declarações dxs envolvidxs na cena, para o vocabulário, que não é outro que o das justificativas e desculpas comumente usadas em casos de agressões e abusos. É como a cultura do estupro, que discute Nádia Lapa em seu texto e da qual já falamos bastante aqui no blog, se constrói pelo discurso.

As pessoas têm o direito de fazer o que quiserem com o corpo dx outrx? Uma agressão é um direito? Não seria, por acaso, por ele ser homem - por seu corpo não ser imediatamente tido com um bem público - que ele esteja menos sujeito à falta de respeito do que sua colega mulher? E a culpa então recai sobre a própria mulher, cuja beleza atrai e justifica o assédio? Estratégia clássica de minimização do ocorrido: a naturalidade do colega, o "bom humor" de outro expectador da cena, a negação dos fatos pelo diretor do programa...



Lendo na internet discussões sobre os padrões de comportamento de agressores sexuais, li uma frase que *curiosamente* se aplica à situação descrita aqui. Dizia assim: "Um agressor sexual geralmente acredita que ele é melhor que os outros e que não tem que seguir as regras como as pessoas comuns. Geralmente define a si mesmo como forte, superior, independente, auto-suficiente e muito masculino". Bom, na verdade, essa descrição serve para qualquer machão de grande ego por aí (e pouco importa sua orientação sexual). Aqui, Geraldo não só afirma sua superioridade, inatingível face à impunidade reinante no país (e ao falar de impunidade, ele é consciente de que seu ato não constitui uma simples brincadeira), mas se serve também do subterfúgio perverso de culpabilização da vítima. A culpa de ter sido tocada e apalpada é da moça que estava com um vestido curto e um salto alto. Ela estava pedindo, certo? É o comportamento dela que está em questão aqui, não? É uma vadia mesmo, não é? Pelas fotos, não dá pra ver que ela está gostando? O pior é que muita gente continua concordando nesse ponto, de que a mulher que se expõe é responsável, moralmente responsável pelo assédio que pode vir a sofrer:



Nicole Bahls, com sua beleza formatada de Panicat, é ela mesma uma vítima da concepção machista e objetificadora da mulher. E ela mesma ignora que abusos, agressões, ataques, assédios, apalpadas não são uma questão de sexo, mas sim de poder. “Acho que ele é gay assumido. Se fosse homem, com outra intenção... Mas era uma brincadeira. Se fosse um homem, talvez fosse mais agressivo”. Ledo engano. Nenhuma forma de assédio sexual manifesta o impulso incontrolável do desejo masculino pelo corpo feminino, essa é a desculpa para o que não passa de uma afirmação do poder de um sobre x outrx. Que importa que Geraldo sinta ou não desejo pela mulher que ele decidiu tocar e constranger publicamente! Somente o que importa é o consentimento. Nicole concordou em aparecer na tv de biquíni, concordou em tirar fotos para a Playboy, não concordou em que um desconhecido a agarrasse e tentasse levantar seu vestido em um evento diante de expectadores e fotógrafos. Simples assim. Ele não tinha o direito de fazê-lo, assim como os igualmente babacas do Pânico não têm o direito de fazer muito do que fazem.
Só que isso não é humor, não.


Fonte: Nós estamos sujeitos a tudo, diz Bola sobre brincadeiraNicole Bahls sobre ataque de Gerald Thomas: "Fiquei abalada" ; Gerald Thomas responde a críticas.

Como Conquistar um Homem