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por Barbara Falleiros

Hoje é dia de eleição e a lei proíbe de declarar voto, de tentar pressionar eleitores em favor de um candidato, de fazer propaganda política. Mas não proíbe de relembrar a história e de refletir um pouco sobre o funcionamento das coisas...

Esta caricatura conta a luta pelo sufrágio feminino mostra suffragettes inglesas "que nunca foram beijadas": como vemos, não é de hoje a estratégia de depreciar e ironizar, no plano sexual, as mulheres que lutam por direitos iguais aos dos homens

No início de 2012 comemorou-se os 80 anos da oficialização do sufrágio feminino no Brasil: em 24 de fevereiro de 1932, o presidente Getúlio Vargas assinava o decreto nº 21.076, instituindo o Código Eleitoral Brasileiro, em que constava, no Art. 2º: "É eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste Código", embora o Art. 121 ainda isentasse as mulheres da obrigação do voto. Além disso, só podiam votar as mulheres solteiras e viúvas que possuíssem renda própria e as casadas que tivessem a autorização do marido (estas restrições foram removidas em 1934; quanto à obrigatoriedade do voto feminino, esta veio somente em 1946, aplicada apenas às mulheres que exerciam uma atividade remunerada).

Bertha Lutz: grande nome da
luta em prol do voto feminino
Foi no início do século XX que teve início, na Inglaterra, um forte movimento feminista de luta pelo direito ao voto das mulheres, a Women's Social and Political Union, cujas militantes ficaram conhecidas como suffragettes. Estas sufragistas pioneiras influenciaram um nome importante desta luta no Brasil, Bertha Lutz, segunda mulher a ingressar no serviço público (como bióloga, no Museu Nacional), fundadora (em 1919) da Liga para a Emancipação Intelectual da Mulher e candidata (em 1933) a uma vaga na Assembleia Nacional. Embora não tendo conseguido se eleger, foi deputada na Câmara Federal ao assumir, em 1936, uma suplência. Antes dela, algumas (poucas) mulheres já haviam ocupado cargos políticos, como Alzira Soriano, eleita em 1928 a primeira mulher prefeita (de Lajes - RN) ou a paulista Carlota Pereira Queirós, primeira deputada federal, em 1933.

Alzira Soriano: primeira prefeita
mulher na América Latina

Atualmente, temos uma mulher na presidência da República, e ainda, uma mulher que foi torturada e perseguida durante o período mais sombrio da nossa história recente. Parece-nos que um longo caminho histórico foi percorrido. Mas é o suficiente? Por que é importante termos mulheres participando ativamente da vida política?

Ora, estatisticamente, as mulheres são a maioria no país: ligeiramente a maioria da população brasileira (e da população economicamente ativa), possuem um grau de escolaridade mais elevado e uma esperança de vida maior. No entanto, nas eleições municipais de 2008, foram eleitas apenas 504 mulheres, o que representa 9,7% do total de prefeit@s. E a porcentagem de vereadoras mulheres foi de 12,5%.

A Roberta postou ontem na página Facebook das Subvertidas o link para o Guia Feminista para as Eleições 2012, muito elucidativo, do qual cito trechos abaixo:

As mulheres representam hoje mais da metade da população do brasil (51,03%) e também mais da metade do eleitorado brasileiro (51,9%). São responsáveis por grande parte da riqueza produzida no país e realizam quase todo trabalho doméstico e as tarefas de cuidado, fundamentais para que as pessoas possam viver bem, sentirem-se protegidas, respeitadas e acolhidas no cotidiano da vida. No entanto, nos espaços públicos, onde são decididos os rumos do país, onde são elaboradas e aprovadas as leis, onde são planejadas e implementadas políticas públicas e definidos os projetos de desenvolvimento, as mulheres são minoria. Não porque não queiram estar ali, mas porque são excluídas desses espaços, uma vez que não são eleitas.

Mudar este quadro e eleger mulheres é, sobretudo, uma questão democrática, de justiça de gênero, de justiça distributiva do poder. Se as mulheres constroem a sociedade, produzem riqueza, cuidam das pessoas, cuidam do meio ambiente, educam, cuidam da saúde, é necessário que o poder de gerir o Estado, que gerencia a vida em sociedade, seja dividido igualitariamente entre mulheres e homens.

A União Interparlamentar publicou um índice atualizado no final do mês passado referente à participação das mulheres em 190 parlamentos nacionais. E sabe qual país tem o maior índice de mulheres no parlamento? A Ruanda, que se reconstrói após o genocídio. Logo atrás dela estão, entre outros, Cuba, Senegal, Finlândia, Islândia, Noruega. O Brasil só aparece bem lá embaixo, no número 119, perdendo para uma série de países cujos nomes evocam a miséria, a violência dos conflitos e/ou a restrição cultural da liberdade feminina, como Afeganistão, Serra Leoa, Libéria, Emirados Árabes, Paquistão...

Em termos de participação feminina na política, dá pra ver que estamos mal. Por isso que a lei de cotas, em vigor nas eleições de hoje, é interessante, obrigando os partidos a apresentarem 30% de candidaturas femininas. Como afirmam no Guia citado acima, "votar em mulher pode ser visto como uma ação afirmativa visando fortalecer a participação das mulheres na política formal".

Aí vem o babaca e fala: "Ué, mas vocês aí não querem a igualdade, pra que então ter cotas? Só por que é mulher? Isso é discriminação!", e se for um babaca daqueles que se acha sagaz, "Vocês não falam que existem mais de dois sexos? Como é que tem que ter porcentagem de homem e mulher? E o travesti, não conta? E se o Laerte quiser se candidatar?"

É aquela velha história: Você não está sendo oprimido quando outro grupo ganha direitos que você sempre teve. A realidade e os índices mostram que não há distribuição igualitária do poder e que este desequilíbrio tem como base diferenças de gênero. Mas, claro, não basta votar em mulher só porque é mulher. O negócio é votar em pessoas que não sejam corruptas, desonestas, fundamentalistas, machistas, preconceituosas, elitistas... Diz-se por aí que estes espécimes estão em extinção: por isso mesmo, preocupemo-nos em criar condições para que cresçam e se reproduzam!

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