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Costumo dizer que quando se trata de comportamento humano, se a pergunta é “pode?”, a resposta é “sim, sempre pode!”, já que cada caso é um caso e, em última instância, somos um complexo conjunto de circunstâncias internas e externas que resultam em muitas possibilidades e algumas escolhas. 

Além disso, todos nós já presenciamos e ouvimos histórias de casais famosos e nem tão famosos assim que, após uma traição, voltaram a ficar juntos. Do mesmo modo, também já ouvimos histórias em que, em situação semelhante, não houve conversa nem negociação: foi o fim! 

Isso significa que a resposta certa é: depende! Para o amor sobreviver a uma traição ou a qualquer crise séria, é preciso considerar vários detalhes. O primeiro tem a ver com o que significa “traição” para cada um. Parto do princípio de que se refere, sobretudo, a mentir e enganar seu par. Ou seja, a deixá-lo acreditando que a relação está acontecendo de um jeito quando, na verdade, está acontecendo de outro. 

Porque, convenhamos: se a pessoa chega e diz “olha, estou a fim de sair com fulano ou sicrana. O que podemos fazer com isso?” ou “me interessei por outra pessoa, estou a fim de ver qual é, quero romper e, se for o caso, reconversamos”. Bem, então, deu-se a chance do outro se manifestar ou participar de alguma forma. Não se trata de traição e sim de possibilidades humanas. 

Bem, mas supondo que não houve colocações desse tipo, o que sobra ao traído são aquelas perguntas doloridas e sufocantes, aquela sensação de ter sido feito de idiota, de ter passado por bobo e, pior do que isso, a certeza de que a confiança e o respeito ficaram profundamente abalados. E é a partir disso que se trata a questão da sobrevivência do amor. 

O fato é que se a traição aconteceu porque já não existe amor, então não há o que ser dito ou feito ou tentado. Está tudo acabado e ponto final. Mas se ainda há amor, então a questão é: quanto cada um está disposto a realmente ouvir o que o outro tem a dizer, a tentar compreender suas razões, a conversar sobre a própria relação e o que a deixou frágil a esse ponto? 

Qual a disponibilidade de quem mentiu ou omitiu informações tão importantes de reconsiderar suas escolhas, de rever seu comportamento, de se comprometer com a verdade a partir dessa crise? Quais sentimentos restaram? São suficientes para arriscar um recomeço ou o mais honesto consigo mesmo e com o outro seria cada um seguir seu caminho? 

É preciso considerar que, num momento como esse, em que uma traição se impõe entre duas pessoas que se amam, muitos sentimentos ignorados, negligenciados e empurrados “para baixo do tapete” vão emergir. O lado escuro e abandonado da relação vai gritar e exigir atenção! Talvez esteja aí a grande chance desse amor, desse encontro onde ainda existe vontade, desejo, motivação e vida! 

Isso quer dizer que uma traição, por pior que seja, pode ter um lado bom! Será que o casal quer aproveitar esse lado? Talvez não seja possível num primeiro momento, quando dor e raiva estão latentes demais. Mas com o passar dos dias, quando os ânimos começam a retomar seus lugares, a consciência e a maturidade podem ganhar voz e vez. 

Penso que, sobretudo, qualquer salvação tem a ver com diálogo. Muitas vezes falar, muitas vezes ouvir. Muitas vezes se colocar no lugar do outro e entender sua raiva, sua dor, seu jeito de concluir, seu jeito de escolher. E se depois de tudo isso, ainda puderem se olhar nos olhos e reconhecer que por trás de todos os rótulos, máscaras e medos ainda existe uma sintonia de alma, então ainda há amor pra recomeçar...


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