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Meninas, recebo um bilhetinho.

Eu tô namorando, namorando sério. A gente se dá bem, tá aí sempre juntos, dormindo juntos, viajando juntos. Ele conhece a minha mãe, sai com os meus amigos, participa da minha vida. Mas sabe aquela coisa do equilíbrio, dos dois participarem da vida um do outro? Então, não rola. Eu mal conheço os amigos dele e muito menos a família. O que estou fazendo de errado? Me ajuda?
Beijos,
Neide”
Meninas, a Neide não é a Neide.
Mas se eu soubesse quem é a Neide, eu diria pra Neide o seguinte:
- Neide, minha Neide. Calma. Fique calma…

É que o seu negócio é muito mais complicado e, por isso mesmo, muito mais comum do que imagina. O seu negócio, Neide, o seu negócio é o negócio de todo mundo. É o negócio do mundo. É o desiquilíbrio imenso e infinito da vida a dois.
O problema, Neide, é a gente querer ser du Soleil.
A MALABARIZAÇÃO DE TUDO
Acontece o seguinte: eu não sei quantas pessoas no mundo conseguem rodar 12 pratos, apoiados num palitinho de yakisoba, andando num cordão esticado entre a tromba de um elefante e o rabo dum cavalo.
Mas diria que a totalidade dessa população malabarística cabe debaixo da tenda do Cirque du Soleil, esse horrendo espetáculo de impossibilidades.
O negócio é que quando a gente ama e faz desse amor uma relação, a gente se enfia debaixo dessa tenda. E acha que é normal. E acha que cabe.
No amor, somos impossíveis.
Mas a vida, meninas; o dia a dia, Neide; a rotina é feita com o que temos a mão, com o possível.
Esperamos demais dos outros, do outro.
Claro, claro, claro: sejamos aqui políticos e corretíssimos: eu diria à Neide que se o seu namorado estiver exagerando, se ele NUNCA quiser ver teus amigos, se ele NUNCAquiser que você veja os dele, se ele tem preguiça 100% das vezes em topar as coisas que envolvem o seu mundo ou as que te trazem pro dele; se ele for muito sem diálogo e abertura no que te incomoda, levanta o sinal de alerta aí, que o gigante vai mal.
O NUNCA é sempre o problema. Mas eu diria que o problema aqui NUNCA é o NUNCA.

Eu diria que o namorado da Neide tem um jeito, umas manias, uns gostos. E essas manias, esses jeitos e esses gostos são muito comuns entre homens. Mesmo!
Homens, meninas, quase sempre sentem essa vontade de rebeldia, essa necessidade de armar a barraquinha num cercadinho particular e impenetrável. É quase como se fosse um reduto pra poder se esconder de você, ter saudade de você, manter sob controle e longe da tua vista as coisas bestas que ele faz (porque todo homem, na intimidade, é bestíssimo, meu pai!), pra que ele consiga afrouxar a barriga, pra que ele possa ser ele mesmo sem estufar o peito pra sempre.
O que eu quero dizer, minha Neide, é isto: as pessoas são diferentes. E às vezes, o seu namorado precisa mais desse espaço do que outros.
Só que aí a gente compara, a gente engorda as minhocas com um milhão de teses, um milhão de necessidades, e achamos que o sujeito que seja um espelho do que te faz sorrir é possível.
Mas não é.
Não mesmo.
No amor, somos Soleil: achamos que o impossível dá pé. Que o prato não cai. Que aquele movimento não dói. Queremos percorrer a corda bamba a dois, de mãos dadas, um ao ladinho do outro.
Mas não dá.
NUNCA dá.
Não mesmo.

A IMPORTÂNCIA DO UNIVERSO PARTICULAR
O problema todo é que a gente imagina as coisas como elas deveriam ser pra gente. Eu juro que te entendo, Neide: você deve ficar enrolando a mechazinha de cabelo, e num silêncio barulhentíssimo e interno deve pensar:  “mas eu não tou pedindo muito! Não precisa ser toda vez! Só queria participar mais! Só queria que ele enxergasse que eu sou legal também pra fazer as coisas dele! Que sou boa companheira! Que não vou atrapalhar! Que não precisa ser sempre, mas só um pouco! Que dividir é bom! Que a mãe dele já deve estranhar eu nunca ter aparecido! Que… que…”
Eu sei. Fica parecendo que não é 100% sério o amor, mas 50% de entrega, a metade que você se esforça pra unir. Que ele quer te manter longe pra facilitar as coisas num caso de rompimento. Ou que ele tem traumas. Ou…
Ou nada disso. Pode ser que ele tenha preguiça. Pode ser que ele seja tímido. Pode ser que ele tenha medo de misturar as coisas. Pode ser que ele tenha medo de te decepcionar. Pode ser que ele goste assim, da distância que permite a saudade. Pode ser que ele queria ser tonto, bobinho, moleque, e isso só dá pra ser sozinho com os amigos dele. Pode ser tudo, provavelmente é um pouco disso tudo e mais um monte de coisa.
Sei lá.
É assim. Não só contigo.
Quem sabe ele não quisesse que você quisesse menos?
Quem sabe a namorada perfeita pra ele seja a namorada que não quer tanta proximidade?
Quem sabe ele faz as coisas com teus amigos e tua família pra te agradar, mesmo que ele não goste.
Sei lá.
E aí começamos a chegar no centro da conversa toda (hoje estou matraquíssimo): Neide e meninas, ele tem as razões dele.

E Neide e meninas, diante de um homem tão díspar, tão contrário ao que vocês esperam, só há um caminho possível: antes de subir na corda bamba, conversem. Perguntem. Abram o jogo. E abrindo o jogo, ouçam. Entendam. Pesem. E daí, decidam.
Ó, papaizinho: eu queria falar tanto mais, mas se eu falo tanto mais, me puxam a orelha, que no caso, a esta altura, já está devidamente puxada por mim mesmo, que é pra poupar as unhas da minha chefe, que chegou até aqui no texto imaginando alto “mas isto não acaba nunca?”, e eu direi: “puxa, o negócio é que não acaba…”
Mas tá quase.
A CORTINA DE FERRO
Neide, eu imagino que você já tenha dado os toques nele. E imagino que a resposta dele foi um mistério ou algo que faz pouco sentido. O segredo todo é dosar as diferenças, deixar elas no mínimo aceitável pros dois. Se for aceitável, sigam. Se não for, briguem pra que sejam. Se realmente não der, não deu.
Mas amor é briga. Não a briga pequena, mas a briga a dois, pra fazer os dois darem pé. Porque eu disse e digo: amor é feito pra tudo, menos pra dar pé.

E daí, a briga a dois. A tentativa de acertar. De ajustar. Ou de respeitar o desajuste. E entender o outro lado.
Uma lição: as pessoas não mudam assim tão completamente. Ou melhor, talvez mudem, mas se a mudança que você espera dele precisa ser tão gigante, poxa, tem alguma coisa errada aí: você quer um outro sujeito, não ele.
Neide, você não está fazendo nada de errado além de fazer o que todo mundo faz: esperar demais, se culpar demais.
Ah, Neide, eu vou voltar ao seu tema.
Prometo. Daqui umas semanas, vou levar esse negócio além. Vou falar do problema capital, o problema inicial de todo amor: as expectativas.
Mas não agora.
Que eu preciso ir.


  • J. ANTÔNIO

    Meu nome é J. Antonio e sou um amador. Jogador de futebol amador, jornalista amador e poeta amador. Frequento duas academias: a de Letras e a do bairro. Na última, convivo e suo ao lado de halteres e halterofilistas amadores. E ao lado de meninas, que brincam de fuzilar gordurinhas, todas lindinhas, molhadas e com calça fusô (minha leitora: é 'fusô' ou 'fuseau' o nome da calça? Eu tenho essa dúvida). Mas dizia que sou poeta e malhador. Aos fins de semana, gosto de correr e comer. Sou bruto e macho, mas sensível. Choro escondido – e ó, se um amigo me perguntar, eu nego. Eu nego! Mas sim. Quando a coisa aperta, quando a vergonha afrouxa, ou quando uma de vocês, mulheres, me machuca, eu choro. É assim desde que nasci. Há 30 anos.REVISTA MARIE CLAIRE

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