Luiz Alberto Hanns
Entenda por que a sintonia no estilo e no temperamento do casal é importante para o sucesso da relação e veja como superar os descompassos nesse quesito
No último artigo falamos de casais que são complementares em suas necessidades psicológicas: um gosta de proteger, outro é dependente; ou um é ansioso, outro sabe acalmar. E de casais que se repelem: um é perfeccionista e obsessivo, outro é distraído e desencanado, ou um é carente e o outro detesta grude e precisa de liberdade. E vimos que pode valer a pena continuar casado e aprender a lidar com diferenças de personalidade.
Leia: Vocês combinam psicologicamente?
Hoje falaremos de casais que se atraem ou repelem pelo ritmo e estilo. Por exemplo, há casais cujo temperamento, ritmo e estilo combinam, eles curtem a vida juntos. Ambos gostam de acordar cedo, de conhecer pessoas, de tomar lentamente o café da manhã no domingo. Outros têm ritmos e jeitos que não combinam e embora se amem e sintam atração sexual. Fora da cama não estão em sintonia. Nesses casos pode-se aprender a lidar com diferenças de ritmo e temperamento, mas é preciso perceber o que “está pegando”.
Ao casarem você e seu parceiro entrelaçam suas vidas. Morarão juntos, compartilharão a escolha dos móveis, dos talheres e do tipo de colchão e terão de ajustar horários de refeição, curtir lazer em conjunto e ter amigos em comum. O ritmo dele no lazer, no trabalho, na vida doméstica, o modo como ele conversa, adormece: você nota tudo. Também os dias em que ele está de mau humor, ou com gripe ou diarreia. O modo como um respira afeta o outro. E sem uma sintonia vocês começam a se irritar com o jeito do outro.
Não seja você!
Desde o namoro Mariana, 32 anos, achava Paulo, 35, espaçoso, espalhafatoso e extrovertido demais, mas pensava que com o tempo ele poderia ser mudado. Ficava incomodada com o modo pouco respeitoso com que ele lidava com garçons, manobristas e desconhecidos. Além disso, ele era o piadista de plantão, o que a deixava constrangida. Também se sentia atropelada pelo seu ritmo sempre a mil por hora. Ele gostava de acordar cedo, ela tarde, ele comia lentamente, ela comia rápido, ele falava muito, ela gostava de silêncio. Com o peso da rotina de casamento, Mariana começa a achar o jeito de Paulo insuportável. Tenta falar com ele, mas Paulo reage no seu estilo bonachão, fazendo piada (ele imaginava que ela estivesse mal-humorada, sobrecarregada com a casa). Aos poucos a irritação dela começa a contaminar as outras esferas da relação, inclusive a sexual. Ao não gostar do jeito do parceiro, de certa forma ela pede que “ele não seja ele”.
Nem sempre é viável lidar com temperamentos incompatíveis. Mas no caso de Mariana e Paulo foi possível! Porque a repulsa só partia de Mariana e porque havia outros itens que os uniam, como atração sexual, valores e projetos de vida. Falta de sintonia no ritmo e temperamento não se “cura”, se ameniza, se houver outros aspectos bons na relação. Isso se consegue conversando e aprendendo a negociar espaços, algo que em terapia de casal se faz com frequência.
Mas em alguns casos sua irritação com o jeito do parceiro pode ser só uma reação alérgica a conflitos que surgiram em outras áreas. Vocês combinam, mas você está tão frustrada que não aguenta nem ouvir a voz dele. Não confunda seu eventual estresse atual com não gostar do jeito de ser do parceiro.
O casal perfeito
Emília e João combinavam em temperamento, ritmo e estilo e tinham grande prazer em curtir a vida juntos. Mas depois de oito anos passaram por um período de grande estresse: desemprego, falta de dinheiro e um filho que subitamente ficou diabético. Logo depois a sogra invasiva veio morar com eles. Era mais do que podiam aguentar. Com tantas pressões e muitas divergências, um passou a se irritar com a mera presença do outro. Emilia não aguentava nem vê-lo chegar. Mas, quando dois anos depois os problemas foram se resolvendo a alergia de Emilia ao jeito do parceiro desapareceu! Diferente de Mariana e Paulo, que mesmo sem stress externo não combinavam no temperamento, ritmo e estilo.
Aprenda, portanto, a separar as coisas: uma coisa é seu estresse atual, outra é de fato não combinar com o estilo do parceiro.
Mas falemos agora de casais que sofrem de uma falta de sintonia de temperamentos e estilos bem diferente e na verdade insolúvel. Eles não se irritam, o problema é que não se encaixam, não há encanto. O parceiro até é visto como ótimo sujeito, mas sem charme, sem graça.
Marido “bonzinho”
Claudio, 38, e Glaucia, 35, estavam casados havia oito anos, sem filhos. Glaucia aprecia o caráter de Claudio e o acha inteligente e bonito, mas sente por ele apenas um amor fraternal. Ele lhe parece apagado, desinteressante, sem iniciativas, pouco imaginativo, não tem “sal nem pimenta”. Embora tenham afinidades, apreciem os mesmos programas e compartilhem projetos de vida, ela sente-se triste ao lado dele. Sente mais amizade que atração, e se culpa por ter casado sem paixão (embora na época isso não fosse tão claro). Pensa que Claudio “merece alguém que realmente o ame”.
De fato, faltavam a Claudio carisma, vibração e interesses próprios. Mas para outras mulheres menos exigentes ele poderia bastar. Hoje ele está casado com uma mulher mais compatível com suas características. Glaucia também não se arrepende de ter se separado e está experimentando novos parceiros mais vibrantes (inclusive uma intensa relação com uma mulher).
Se você estiver num casamento chocho com um marido sem graça, como é possível só após alguns anos ter descoberto que acha seu parceiro “sem-sal”? Talvez isso já existisse antes. Você pode ter casado porque precisava superar uma decepção amorosa. Ou porque achou que era a hora de se casar, ou por pressão do parceiro, que era confiável, “a pessoa certa para mim”. Ou seu parceiro já foi mais carismático e, ao longo da vida, perdeu a cor diante de sucessivas frustrações. Ou você mudou e evoluiu mais que ele e não mais vê encanto nele, que continua o mesmo. Muitas vezes, nesses casos não há o que fazer: ou você se contenta com uma relação chocha, mas que lhe dá segurança, ou se separa e busca relações mais intensas.
Também há casos em que você talvez descubra que, na verdade, você mesma se acha “sem graça” e precisa de um parceiro que supra seu déficit. Espera do parceiro, supostamente “sem graça”, uma excepcional vitalidade e entusiasmo, que valha pelos dois. E se o parceiro for apenas uma pessoa comum, pode lhe parecer insuficiente. Nesse caso vale parar de culpar o parceiro e experimentar você mesma ser mais vibrante e se engajar em coisas interessantes.
E por fim há casos em que você acha o parceiro insosso porque a rotina de vocês matou a aventura e a sedução. Nesses casos vale a pena conversarem e tentarem investir mais na relação e não ficarem atolados nas chatas obrigações domésticas e familiares.
Enfim, se você for como a maioria das pessoas, em algumas fases do casamento o ritmo, temperamento e estilo de vocês pode não combinar ou até irritá-la, examine com calma o que se passa, pois, como vimos, algumas das situações acima são superáveis e pode valer a pena investir na relação.
* Luiz Alberto Hanns é terapeuta com mais de 20 anos de prática clínica e autor de “A Equação do Casamento -- O que pode (ou não) ser mudado na sua relação” (Paralela). Na coluna “Vida a Dois”, ele fala sobre os desafios da vida em casal.
Fonte: Será que você gosta do jeito de ser do seu parceiro?»
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