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Sobrecarga de trabalho, milhões de obrigações familiares e sociais, demandas urgentes com os filhos, rotina enfadonha no relacionamento estável e crises de insatisfação com o próprio corpo – que parece muito distante do modelo de beleza talhado a bisturi e malhação. Com tudo isso, não é de se estranhar que muitas mulheres coloquem o sexo em segundo plano. Ou melhor, em oitavo. É essa sua posição no ranking dos ingredientes que garantem às brasileiras qualidade de vida, de acordo com uma pesquisa realizada em dez capitais do país e coordenada pela psiquiatra Carmita Abdo, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. E os fatores acima são algumas das justificativas citadas para o descaso. Mas a causa pode estar também ligada a questões de saúde, como anemia, diabetes, hipotireoidismo e transtornos de ansiedade, às vezes acompanhados de uso excessivo de álcool e drogas.
O fato é que o sexo acaba fora do cardápio de bem-estar e felicidade. No livro Descobrimento Sexual do Brasil – Para Curiosos e Estudiosos (Summus Editorial), Carmita observa que 27% das mulheres enfrentam a falta de desejo sexual persistente. A situação atinge especialmente as faixas etárias de 18 a 25 anos e acima dos 40. Elas não conseguem se excitar, não relaxam, travam... E preferem evitar a cama. A expert diz que dá para reverter o quadro. O primeiro passo é sair da inércia e investigar as causas – que podem ser físicas ou emocionais. Só com um diagnóstico mais preciso é possível traçar uma estratégia de regaste da vontade e do prazer.
Remédios e hormônios
Quem tem depressão, que está no enredo de 40% dos casos de desejo frágil, deve conversar com o médico sobre remédios. Antidepressivos atuam no sistema límbico, o responsável pelo controle das emoções, e diminuem a libido. A dose pode ser reajustada ou a droga substituída por uma mais adequada. A desvenlafaxina regula de forma mais natural os neurotransmissores serotonina e noradrenalina sem interferir no sexo. A agomelatina e a bupropiona são também alternativas encontradas no mercado. Outro ponto a investigar é a dosagem das substâncias químicas do organismo que influenciam o desejo sexual. A testosterona, hormônio masculino ligado à produção da libido e presente na mulher, aumenta no meio do ciclo menstrual e faz crescer a vontade de ir para a cama acompanhada. O estrógeno, hormônio feminino que determina as curvas, é o combustível do sexo. Em baixa concentração após a ovulação e o parto e na menopausa, tende a deixar a mulher sem excitação e com a vagina ressecada. No período fértil, quando ela está pronta para engravidar, seu nível elevado joga o desejo lá em cima. Já a progesterona fica em alta no fim do ciclo, reduzindo o desejo para que, em tese, o corpo feminino priorize a gestação. Exames para avaliar os níveis hormonais identificam desajustes e o médico pode orientar como corrigi-los.
A reposição hormonal – apesar das polêmicas que a relacionam ao câncer – ajuda a recuperar a libido. Em alguns países, são ministrados adesivos de testosterona, mas, no Brasil, o método é controverso. “O uso está liberado só para mulheres que retiraram os ovários e para depois da menopausa”, diz Carmita. Na batalha, ainda não dá para contar com o “Viagra da mulher”: assim conhecido, o remédio Flibanserin, do laboratório Boehringer Ingelheim, caiu em desgraça antes mesmo de aparecer nas farmácias, pois o FDA, órgão que regulamenta os medicamentos nos Estados Unidos, atestou sua ineficácia. “Outros estudos têm sido realizados com o objetivo de chegar a drogas que atuem no sistema nervoso central para melhorar a energia sexual feminina”, afirma a psiquiatra. A dor no ato sexual (dispareunia) e a contração involuntária dos músculos da vagina (vaginismo) também podem levar a repelir o sexo. “Algumas mulheres com problema têm o tônus muscular tão aumentado que não conseguem introduzir sequer um absorvente, porque dói”, diz a fisioterapeuta e doutora em urologia Mirian Kracochansky, de São Paulo. Em sessões de fisioterapia, exercícios de relaxamento ou de fortalecimento, conforme o caso, combatem o problema e ainda devolvem a lubrificação da área.

Quando o físico está em dia, o olhar recai sobre as emoções. Vibradores e lingeries não fazem efeito se o obstáculo estiver na cabeça. Se uma mulher viveu abuso na infância ou qualquer situação traumática na cama ao longo da vida, muito provavelmente vai reprimir seu desejo. Outras se retraem diante de um parceiro autocentrado ou que não as deseja com a intensidade que elas idealizam. E há o freio da educação. Meninas são criadas para pensar no prazer do outro. As mães nunca ensinam que gozar é um direito delas. Em geral, é caso de recorrer à psicoterapia, que permite rever experiências dolorosas e derrubar tabus.
Descomplicar e aproveitar
E quando se apaga a chama em um casamento que era bom e se desgastou? Nesse caso, a criação de oportunidades para reaproximar os dois costuma reacender o fogo. A meta deverá ser conhecer de novo o parceiro. Com tempo, um pode se tornar quase um estranho para o outro. Boas conversas em um ambiente diferente e programas prazerosos a dois são recomendados. Mulheres querem transar com o homem que admiram. A psicóloga Carla Zeglio, diretora do Instituto Paulista de Sexualidade, em São Paulo, lembra que a relação amadurece e as rugas aparecem, mas cada um mantém as mesmas qualidades que atraíram e fizeram com que o casal se formasse. A dica: “Se levar isso em conta, a história que parecia fracassada se transformará em algo novo.” E a paixão renascida é garantia de vontade e excitação. “Aí a mulher pode estar com dor de cabeça, cansada, no pós-parto, na menopausa, e nada a impedirá de querer e ter prazer na cama.” Basta não se guiar pelas imagens romantizadas da mídia, que prega a perfeição mostrando noites caras, com velas, bebidas finas e jeito de maratona erótica. “Complicar tanto só deixa o sexo mais distante e inacessível. Quando a gente parar de tratá-lo como uma coisa extracotidiana, as queixas de falta de desejo serão mais raras.”



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