″Era 1:20 da manhã quando acordei pra fazer mais um simples xixizinho da madrugada (prática frequente no último mês…). Mas algo estava diferente. É engraçado dizer isso porque eu não tinha, até aquele momento, nenhum indício de que o trabalho de parto começaria. Não tinha cólicas e as contrações estavam lá, mas bem espaçadas e como eu já vinha tendo as de Braxton-Hicks, BH, também conhecidas como contrações de treinamento, não estava muito preocupada.

Mas como eu disse… algo estava diferente. De repente, soltou o intestino (o que também aconteceu no trabalho de parto da Nina, minha primeira filha). Então, papel e caneta na mão e lá fui eu pra sala contar o ritmo das contrações. Era mais ou menos assim: na primeira hora, de 10 em 10 minutos e duravam cerca de 25 segundos. Na meia hora seguinte, de 5 em 5 minutos, com cerca de 40 segundos. E na próxima meia hora mudou para 7 em 7 minutos, com 40 segundos de duração.
Ao final da segunda hora, comecei a ter leves cólicas (tipo menstruais) que acompanhavam as contrações. Daí fiquei mais confiante de que era mesmo um início de trabalho de parto e acordei o Alê (que já tinha vindo duas vezes, bem sonado, me perguntar: – Está tudo bem?) e que dizia que achava bom já ligar pra Dra. Andréa. Ela perguntou como estavam as contrações e disse que estava vindo pra cá pra examinar. Parei de contar as contrações porque senti que estavam bem regulares e que as dores estavam lentamente aumentando.
Era tudo tão emocionante que eu tremia um pouco, num misto de medo e ansiedade. Acho que um tanto pela imprevisibilidade do processo, mas principalmente pela inevitabilidade, entendem? Uma vez que começa de verdade, vai terminar em parto, de uma forma ou de outra, e isso é mágico demais e é o que a gente quer, mas gera certo medinho…
Bom, como disse, me concentrei em outras coisas pra me distrair um pouco. Fui arrumar o quarto, reunir as coisas que eu tinha comprado pro parto em casa, acordar a Sandra, nossa querida ajudante… e de repente, a Andréa chegou, com seu casacão (tava muito frio) e sua mala de viagem. Veio fazer o toque: 6 para 7 centímetros! Eu disse: – Nossa, mas já? Então é melhor ligar pra todo mundo. E todo mundo consistia em: Ana Cris, Dra. Mema, minha amiga Katya e nossa amiga Bárbara que iria filmar. Da família ninguém.
Pois é. Essa foi uma decisão que veio cedo, tão logo a ideia do parto em casa se definiu.
Pois é. Essa foi uma decisão que veio cedo, tão logo a ideia do parto em casa se definiu.
Baseados em nossas experiências anteriores na gestação da Nina, nossa família, tanto a minha como a do Alê, não iria ajudar em muita coisa e por outro lado, poderia e provavelmente iria, atrapalhar e muito, questionando nossa decisão com aqueles medos tribais (no sentido de “todo mundo”), com pérolas do tipo: vocês são loucos… e se acontece alguma coisa… sua mãe quase morreu de hemorragia (e ninguém sabe dizer por que).
Seria engraçado, se não fosse um triste retrato dos tempos modernos, – onde a falta de tempo e a rapidez imperam, tanto que as pessoas não têm medo algum de fazer uma cesárea, ou de se submeter a um parto cheio de intervenções e medicamentos, na maioria das vezes, desnecessários. A massa parece não ter receio algum disso. Devem estar todos anestesiados, de tanta “informação emburrecente”, vinda principalmente da televisão, mas que encontra respaldo até em publicações específicas, como revistas sobre gestação, parto e cuidados com o bebê.
Eu considero, queridas amigas adeptas do parto natural, que somos realmente privilegiadas. Por algum motivo maior, fomos levadas às pessoas certas, às informações imparciais, que realmente priorizam o nosso bem-estar e dos nossos bebês. Enfim, me empolguei. Mas voltando ao relato. As moças foram chegando. Primeiro a Ana, depois a Mema, quase junto a Katya. E nada da Bárbara acordar. Eu já temia… lá foi o Alê buscar a câmera emprestada de outro amigo, que por sorte nossa acordou na madrugada (eram mais ou menos 5:00) pra nos acudir.
A essa altura eu já estava com dores bem mais intensas e realmente não usei nada de fórmulas prontas. O que fazia as dores ficarem mais suportáveis era a movimentação. Mas não andar simplesmente. O que funcionava mesmo eram as “batidas laterais”. Alguém sabe o que isso significa? Devo ter feito ao todo umas 8 aulas de dança do ventre, com intuito terapêutico e nunca imaginei que fosse utilizar um dos passos na hora do trabalho de parto. Essas batidas laterais me ajudavam a relaxar a bacia – o que eu sabia ser positivo pra descida e encaixe do bebê – e ao mesmo tempo distraíam a atenção das dores.
Eu estava incrivelmente calma, aceitando o processo e não me preocupando com o fim. Era uma confiança daquelas que a gente não sabe bem de onde vem, mas que nos toma por completo. Eu sabia que estava fazendo o melhor possível e então mantinha a calma e o bom humor e na hora da dor, batidas laterais! Ah, e também tinha vontade de cantar. No começo era musical. Depois foi virando meio um sopro com som, mais visceral, à medida que as contrações iam apertando. (depois que tudo aconteceu meu marido disse que parecia assombração, mas eu nem liguei…).
Lá pelas 6:30 foram todos tomar café da manhã, acreditam? Tava a maior festa na minha cozinha, chazinho, pão, leite… todo mundo sentado, rindo conversando… eu achei o máximo! Esse tipo de coisa só num parto em casa, né gente? Imagina numa maternidade se o médico diz a essa altura pra parturiente: - Bom, você me dá licença que eu vou até ali tomar um café, junto com a doula, assistente e o teu marido…, acho que a mulher pira de ansiedade e medo. Mas em casa não, tudo é diferente, mais tranquilo, familiar (mesmo sem família!), aconchegante… Mas eu não tomei café não. Não tinha fome. Na verdade, não ingeri nada a não ser água nessas horas todas. Enquanto isso, tentávamos acupuntura na sala, eu e a Katya, pra ver se sedava um pouco a dor. Chegou a melhorar, mas comecei a ficar agoniada de ter que me manter parada, por causa das agulhas, então, quando o café da manhã acabou, chamei o Alê pra ir pro chuveiro comigo, pra ver se aliviava.
Bom, gente, tenho que dizer a verdade: nessa hora o bicho pegou! É a tão falada fase de transição que antecede o expulsivo. As dores aí aumentaram bastante, mas eu continuei com os movimentos, os sopros, me apoiando no Alê, que quase morria de frio coitado e perguntando pra Ana Cris se eu ia saber quando fazer força. Ela dizia: “Você vai saber sim. Vai te dar uma vontade incontrolável, não se preocupe.” E nesse momento eu tentava me concentrar em cada contração e realmente não pensar na próxima.
A Andréa pediu pra ouvir a bebê. Estava tudo bem. Voltei pra água. Comecei a ter vontade de fazer força, mas era mais vontade de evacuar. De novo: “Ana, tô com vontade de fazer c…” e ela, “ É um início de vontade de empurrar, vamos ver se já dá”. Volta a Andréa, dessa vez pra fazer o toque (segundo e último!). “Nossa, a bolsinha tá aqui, inteirinha! Tem só um rebordinho de colo. Já vai começar já, já.”.
A essa altura estava mais que decidido que ia nascer ali mesmo, no banheiro. Era uma noite muito, muito fria e o banheiro tava aquecido por causa do chuveiro. Então trouxeram a cadeira de parto. De repente, super lotação. Todo mundo entrou. Tinha gente até dentro do box.
Início do expulsivo: a contração vinha e eu fiz umas duas forças sem muita convicção. Na terceira já empurrei mais forte. Na quarta comecei a sentir um ardor no períneo e a Ana disse algo do tipo: “Agora você vai começar a sentir esse ardor que é justamente a cabeça dela que tá abrindo passagem. Não fique com medo dessa dor. Ignore e continue pra não travar ”. E devo dizer que isso foi bem importante nessa hora, porque é uma dor diferente, que de certa forma a gente não espera. Então, enquanto aguardava pela próxima contração (é incrível como nessa hora elas espaçam e parece que não tem nada acontecendo ali…) me concentrava e conversava um pouco. Todo mundo animado com a “bolsinha íntegra”, ficavam olhando no espelhinho e dizendo, “que bonitinho…”. São todas umas doidas apaixonadas por parto natural!
Então, a Nina acordou mas isso não me desconcentrou. Alguém foi buscá-la. De repente, a quinta força.
Então, a Nina acordou mas isso não me desconcentrou. Alguém foi buscá-la. De repente, a quinta força.
Um grito forte, nessa hora gritei mesmo. Mas uma coisa não planejada. Imaginei que ia respirar fundo e tudo bem, mas na hora não deu. Senti que a cabecinha tava passando, mas não sabia se ia voltar pra dentro. E de repente a Andréa falou: “Não precisa mais fazer força” e então, gente, ela disse: “Pega ela, pega”, e eu, meio sem entender, olhei pra baixo e subi minha pequena direto pro meu peito, que já veio chorando, gritando, eu cheguei! Eu cheguei! Consegui!
Que coisa mais maravilhosa! Isso não dá pra pôr em palavras. Sentir ela, quentinha, ainda meladinha, junto de mim foi o momento mais mágico da minha vida. Que delícia! Ainda consigo sentir a sensação de felicidade e êxtase por tudo. Por ter conseguido o que no parto da Nina não foi possível, por ter superado os momentos de dor, por ter tomado as decisões mais sábias e escolhido muito bem as pessoas presentes.
Por tudo!
Então a Nina entrou no banheiro e não entendeu muita coisa. Ficou olhando aquele monte de gente, aquele bebê no colo da mamãe que era só dela… e só depois de uns cinco minutos é que começou a interagir. Mas esse é um outro capítulo da estória, que só está começando…
O que tenho a dizer pra vocês, principalmente às que ainda estão esperando, é que vale muito a pena esperar. Mesmo! Confiem, conversem com seus bebês na barriga, digam o que vocês querem. Vocês podem não acreditar, mas uma semana antes do parto eu tava meditando e comecei a me concentrar na Mel e dizer pra ela ajudar pra que o processo pudesse ser o mais natural possível, que a gente tava planejando o parto em casa (isso ela já sabia), que era melhor não ter cordão enrolado nem bolsa rota (na Nina isso foi bem difícil pra mim), que aqui a gente poderia ficar juntinho o tempo todo, que ninguém ia levá-la de mim, que ela ficasse tranquila que tudo acabaria bem etc.
Sou suspeita pra falar, mas acredito muito nisso. O bebê tá lá, dentro da gente, isso por si já é mágico, acreditem! Mas acima de tudo, mantenham a calma e confiem no processo. A natureza não é burra! Nós temos todas as condições de dar à luz ao bebê que geramos, naturalmente. Quem não tem é exceção. Confiem! Sempre!
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